segunda-feira, 18 de maio de 2009

O som de Ana.

Continuando a onda de coisas com personagens...

Aninha era uma menina que queria conhecer a vida em sua plenitude.
Queria entender dos mistérios dos homens, dos animais, do sagrado, de tudo. Enchia-se de vida por todo espaço que pudesse encontrar e nunca aprendeu a distinção humana entre o belo e o feio.
De certo modo, essas separações não faziam sentido para ela. Ela adorava assistir partos de animais, ver acidentes ou simplesmente frutas caindo do pé. Abria tudo que encontrava pelo caminho com o intuito mais belo e infantil de ver como as coisas são por dentro.
Ana não usava as palavras da mesma maneira que nós.
Quando perguntavam porque ela abria as coisas ela dizia :" Quero ver como é de verdade." A família dela nunca questionou, censurou nem tampouco incentivou os hábitos desbravadores da menina.
Ana não tinha muitos amigos. Sua vontade de entender tudo demais à sua maneira exótica sempre afastou as crianças da sua idade. Quando seus coleguinhas estavam descobrindo as diferenças de sexo entre garotos e garotas, ela estava abrindo animais para confirmar as lendas de cegonha.
Ana se enchia de vida. Engolia toda a vida que pudesse encontrar e depois vomitava. "Quero ver como é de verdade."
Ana foi crescendo e percebeu que saber demais sobre a vida tinha lhe custado viver dela muito pouco junto com as outras pessoas.
Ana resolver pesquisar outro setor de vida que não era fisiológico, ao menos a princípio.
Resolveu lidar com as pessoas da sua idade.
À essa altura ela já estava com 16 anos e era o protótipo perfeito da esquisitisse. Usava óculos, não andava na moda, era corcunda e não via motivos que a animassem pra conversar com seus contemporâneos.
A vida a que ela se acostumara era viva demais. Banalidades, embora fossem parte da vida, pareciam com pouco encanto para ela. Algo não digno de ser dissecado.
Mas aquele grupo, banal, por certo, Ana não conseguiu ignorar. Havia vida neles, uma vez que se locomoviam... E ela resolveu dissecar...

Nessa vida locomotiva que ela assistia, o barulho de "piuí" não era nada poético como as Marias-fumaça. Era um piuí tecnotrancedancehiphop era um chiado barulhento e mudo de essência. Era barulho.

Dissecou, dissecou, dissecou... Alguns ela até quis dissecar literalmente, mas Ana era esquisita e não doida.
E dissecando foi, até descobrir que o que faltava naqueles que a cercavam era som.
Um som que significasse, um som que musicasse, um som que dissesse algo que não fosse apenas sensível, mas inteligível. Um som que não falasse língua nenhuma, mas que falasse todas. Um som que fosse como ela era. Um som que inspirasse as pessoas a querer ver de verdade.

Um comentário:

Mariane disse...

eu abri o velho violão.
e vi o cupim que se alimentava dele.
cumpim não tem som,não tem beleza,não tem nada.
cumpim tem apenas a matéria-prima.
mas a matéria-prima,apenas o cupim tem.

Ana deve ser assim.